Yeda Couri*

Pouca gente no ambiente corporativo tem se dado conta de que estamos vivendo um período de profundas transformações. Não se trata apenas de modelos de negócio. Mais que isso, estamos assistindo também mudanças profundas no modelo de comportamento a ser adotado dentro do ambiente de trabalho, e as áreas de compliance têm sido as responsáveis por estimular e garantir que este movimento ocorra sem traumas dentro das empresas.

Não tem sido uma tarefa fácil. Para dar conta dela, é preciso lembrar que a abrangência da área de compliance vem crescendo muito dentro das corporações. Há cerca de dez anos, talvez menos, essa era a área responsável por garantir a correção dos números: contas transparentes, concorrências justas, impostos pagos em dia. Até ali, a conformidade era jurídica e legal.

Mas os tempos mudam e, neste movimento, a área de compliance dentro das empresas é responsável também pela correção de atitudes. Não se trata mais apenas de dizer o que pode e o que não pode ser feito em relação à contabilidade da empresa, mas também o que pode e o que não pode ser feito em relação ao comportamento de seus colaboradores, principalmente dentro do ambiente de trabalho.

Aqui, além do básico, dos números, tratamos de temas como respeito à diversidade, respeito à liberdade religiosa, fim do assédio moral e sexual e outros temas que garantam a construção de um ambiente de trabalho diverso e livre de preconceitos. O discurso é muito bonito, mas esbarra em obstáculos culturais bastante fortes, principalmente quando se trata de equipes formadas por profissionais com muitos anos de experiência.

Quanto mais experiente o profissional, mais arraigadas ele tem determinadas questões e comportamentos que, cada vez mais, vão se tornando inaceitáveis nos ambientes de trabalho. É neste ponto que o trabalho da área de compliance ganha um forte caráter educacional: antes das punições, é preciso de que haja orientação, um processo de aculturamento que faça com que a equipe, principalmente os mais resistentes, entendam que os tempos mudaram.

Dá trabalho e leva tempo, mas o resultado é um ambiente corporativo mais leve e respeitoso. E para os que defendem os resultados acima de tudo, estes ambientes se traduzem em equipes mais produtivas e empresas mais rentáveis, inclusive pela percepção de que estas empresas se preocupam com o tema.

Para se ter uma ideia, uma pesquisa realizada em 2010 pela International Finance Corporation, detectou que, já naquela época, 55% dos investidores se dispunham a pagar 10% a mais por ações de empresas com alto nível de governança, que são aquelas com alto nível de transparência. 38% destes investidores se dispunham a pagar 20% a mais.

Parece discurso, não é? Mas basta comparar a valorização do índice Ibovespa com o IGC-NM, índice que reúne empresas que possuem alto nível de governança. Entre 2006 e 2017, o crescimento anual médio do Ibovespa foi de 3,5%. No mesmo período, o IGC-NM cresceu 7,1%, resultando em uma rentabilidade acumulada de 120,1% entre dezembro de 2006 e maio de 2017, contra 47,75% do Ibovespa no mesmo período.

É uma das raras situações em que números e a preocupação com as pessoas andam juntos, mostrando que vale a pena o esforço.

*Yeda Couri é head de compliance da T-Systems Brasil