Alexandre Euclides Ferreira*

Como as empresas podem ter sucesso em uma concorrência global cada vez mais acirrada? Uma dica: Ter um portfólio de produtos que atenda às necessidades do cliente

A tecnologia RFID oferece as ferramentas certas para o aumento da produtividade com flexibilidade e redução dos custos na produção
Os mercados mundiais sofreram uma rápida mudança, de mercados dominados por fornecedores que até então definiam suas condições com relativa liberdade, para mercados dominados por consumidores que impõem suas expectativas nas características e nos preços dos produtos. A razão disto é a concorrência global e crescente proporcionada pela internet, em que através de um clique no mouse é possível encontrar um produto equivalente por um preço mais baixo. E com ela, um paradigma antigo de comportamento competitivo também tem sido dissipado. No passado, pesquisadores de marketing admitiam que uma empresa, para permanecer no mercado, deveria oferecer um produto de qualidade superior, ou que esse custasse menos do que o dos concorrentes. Hoje, em um ambiente hipercompetitivo, ambos os critérios são exigidos para que seja criada uma vantagem competitiva consistente.

E qual é a relação de tudo isso com a produção? Alta qualidade de produção e o máximo em eficiência – indicadores fortíssimos para a automação da produção – hoje são suplementados por uma alta demanda por flexibilidade. De um lado, uma empresa precisa estar apta a produzir lotes menores (lotes de 1 peça) sem elevar os custos, para satisfazer às mais diversas exigências dos clientes. Esta personalização em massa é a chave para dominar um amplo portfólio de produtos, sem aumentar drasticamente os custos com estoque e logística. Por outro lado, as empresas também precisam estar aptas a lançar novos produtos e incorporar tecnologias inovadoras, sem grandes modificações em suas linhas de produção.

A iniciativa para a Digitalização da Indústria assume estes aspectos e procura desenvolver soluções consistentes e sustentáveis para a indústria manufatureira. Em relação aos desafios mencionados, é necessário o enfrentamento através de conceitos de produção voltados para a personalização em massa. A tarefa não consiste apenas no novo equilíbrio da automação em atender às diversas versões de forma econômica, frente à maior flexibilidade possível, mas também permitir respostas rápidas à hipercompetitividade. Isso, portanto, não será alcançado apenas com uma grande invenção, mas, ao invés disso, com várias inovações menores e maiores. O desenvolvimento pode proceder de maneira similar ao da comunicação móvel por meio do smartphone. Neste caso, também não se tratava apenas de uma inovação, mas de uma série de invenções – do transistor à comunicação por rádio, internet e HTML, displays OLED (LED orgânico) e touchscreen, até as baterias de íons de lítio, assim como novos paradigmas de operação como o controle baseado em gestos.

Um conceito de tecnologia frequentemente mencionado no contexto da Digitalização da Indústria é a aplicação da identificação por radiofrequência (RFID). Com ela, os paletes onde os objetos são colocados para transporte – e no futuro cada vez mais nas próprias peças – são equipados com etiquetas para a identificação por radiofrequência, que transportam todos os dados considerados relevantes ao longo da produção, por todo o circuito de produção. Os pontos de leitura RFID existentes nas máquinas ou em áreas de manipulação de materiais realizam a leitura dos dados, permitindo o controle de robôs ou equipamentos logísticos. Isto é necessário para sincronizar continuamente o mapa digital da fábrica, presente nos sistemas de TI, com a situação real. No entanto, devido à granularidade dos dados existentes nos bancos de dados, podem ocorrer desvios pelo mau funcionamento ou intervenções manuais no processo, necessitando uma correção dos bancos de dados. Para que isso possa ocorrer automaticamente, os sistemas RFID enviam as informações essenciais do mundo real como os “olhos e ouvidos da TI”

Entretanto, muito deve ser feito, mesmo sendo o RFID uma tecnologia comprovada há muito tempo. Isso porque este conceito de RFID implica no uso dos dados do transponder por toda a empresa. Se um objeto já vem com dados de RFID, não haveria sentido em não aproveitar esses dados do ponto de vista econômico e técnico. Para alcançar isso, uma série de questões ainda precisa ser respondida. Por exemplo, não existe um padrão uniforme de rádio para RFID. Apesar das bandas de 902 MHz (na banda de frequência ultra-alta – UHF) e 13.56 MHz (banda de alta frequência – HF) serem de fato as frequências portadoras, ainda não está claro qual dessas tecnologias, com suas vantagens específicas, prevalecerá em um longo prazo e no contexto da Indústria 4.0. Considerando-se que os sistemas UHF alcançam uma ampla faixa de vários metros e possuem uma excelente taxa de digitalização em massa, os sistemas HF (em especial os componentes RFID desenvolvidos especificamente para a indústria) oferecem outras vantagens, como a capacidade de armazenamento consideravelmente maior, maior velocidade e, sobretudo a facilidade de uso. Picos ou pontos mortos criados por reflexões – desafios típicos em projetos UHF – normalmente não são encontrados com a mesma facilidade em aplicações HF.

Outro item problemático são os formatos de dados nos transponders. Aqui há um nível de padronização suficiente com a norma[1] EPCglobal em termos de número de identificação único do transponder, mas os formatos na, assim chamada, memória de usuário, ainda estão em fase inicial de padronização ou as normas existentes raramente são aplicadas. Por último, mas não menos importante, a integração dos sistemas RFID em diferentes sistemas de hospedagem – como os controladores lógico programáveis (CLPs), aplicações em PC, sistemas de TI e dispositivos móveis – é resolvida em uma base exclusiva, isto é, em muitos casos, existe a necessidade de se programar uma conexão específica.

A indústria já está se empenhando em muitas das áreas mencionadas acima. Existem grupos de trabalho em associações – como a VDA ou VDMA – onde usuários e fabricantes se reúnem para padronizar as estruturas de dados e processos. Para integrar os sistemas RFID, a AIM (Association of AutoID Manufacturers) e a OPC[2] Foundation, cooperam no desenvolvimento de uma norma baseada no protocolo de comunicação industrial M2M chamado de OPC Unified Architecture (OPC UA). Vários institutos de pesquisa – como a Smart Factory do instituto DFKI[3] em Kaiserslautern ou o instituto Fraunhofer IIS[4] em Nuremberg – também trabalham intensivamente no avanço da tecnologia RFID em cenários de aplicação industrial.

Os desenvolvimentos citados acima para uma penetração mais ampla no mercado pelo RFID não são o fim das inovações. Por exemplo, como os sistemas ciberfísicos representam uma visão interessante, que em relação ao RFID não preveem os transponders apenas como meios de armazenamento sem inteligência, mas preveem cada vez mais outras tecnologias de sensoriamento (p. ex. câmeras ou sensores de temperatura) e sistemas de processamento. Com base em regras e algoritmos programados, um transponder RFID pode combinar os dados armazenados, e também dados adquiridos por sensores, para, então, tomar “suas próprias decisões” a partir dessas informações. Peças equipadas de tal maneira não são mais apenas simples objetos de produção, mas ao invés disso, são capazes de se mover pelo ambiente de produção como sujeitos autocontrolados. Esta abordagem nos leva a pensamentos sobre a Internet das Coisas no ambiente industrial. Se um desenvolvimento dessa natureza realmente faz sentido, tanto do ponto de vista tecnológico, como econômico, isso será revelado através do trabalho de pesquisa e desenvolvimento.

*Alexandre Euclides Ferreira, consultor técnico para sistemas de comunicação e identificação industrial da Siemens